Artigo publicado em 30/07/2015, na coluna do correspondente do Estadão, GILLES LAPOUGE:
"Ainda o caso dos migrantes. Mas, desta vez, o lugar da tragédia não é a
Itália, ao redor da Ilha de Lampedusa, ou na Grécia, nas ilhas próximas
da África, mas na França, no norte da França, em Calais. A cidade de
Calais é o porto francês que constitui o ponto de partida do
Eurochannel, o túnel sob o Canal da Mancha no qual circulam trens
diretos entre a França e a Grã-Bretanha. Por que multidões de migrantes
se amontoam nesta cidade? São os mesmos migrantes que conseguiram
desembarcar na Europa, pela
Itália ou pela Grécia, e em seguida foram se esgueirando, durante meses,
de país em país até Calais, pois sua meta é a Grã-Bretanha. Portanto,
uns infelizes - africanos, sírios, paquistaneses, eritreus, as
mesmas figuras fantasmagóricas, as mesmas carcaças devastadas, o mesmo
desespero no fundo de seus olhos fixos, sem brilho.
E cada noite, é o mesmo carrossel. Em grupos, nas sombras, 30, 50 homens chegam até o Porto de Calais e ao Eurochannel e tentam embarcar nos furgões. Os guardas os escorraçam. Os migrantes se retiram. Mas recomeçarão dez, cem vezes. Na noite de terça-feira, 2.500 exilados tentaram entrar na Grã-Bretanha. Cinquenta deles conseguiram. Cerca de 20 ficaram feridos. Um migrante foi morto pela manobra de um peso pesado desesperado. Outro foi eletrocutado. (...)
O lamentável episódio, que ocorre após uma série de outros, confirma uma verdade evidente aos olhos de todo o mundo, salvo aos olhos dos governos da Europa: os migrantes são um espinho doloroso no flanco da Europa, da União Europeia. Infelizmente, o drama dos migrantes manifesta de maneira clara que, apesar da União Europeia, o egoísmo sagrado das nações é muito forte no continente supostamente unido. Egoísmo? Por que a Itália deve lutar sozinha, sem um apoio sério de Bruxelas, para acolher multidões de migrantes que só transitam por seu território para se dispersar em seguida por toda a Europa? Por que deixar a Grécia, país em ruína, se debater sozinha com os milhares de africanos moribundos que aportam em suas plagas? E por que a França deve, sozinha, sem um apoio concreto da União Europeia, administrar a presença de 5 mil migrantes acotovelando-se no Porto de Calais à espera de uma carona, quase impossível, para a Grã-Bretanha?
A União Europeia, assim como a zona do euro, não trouxeram a prosperidade à Europa. Trouxeram a crise, o desemprego, o caos. Mas este não é o único fracasso da União Europeia. Ela é praticamente nula em matéria de fraternidade e de economia. Foi incapaz de dar um início à concretização das grandes esperanças que os criadores do euro, há 60 anos, haviam previsto em seu tratado. Eles juraram fazer da Europa um vasto espaço em que o amor substituiria a guerra, um continente onde reinaria a fraternidade. Hoje em dia a fraternidade é bela. É bem verdade que quando do primeiro balbucio histórico da Europa, a futura Roma foi criada por dois irmãos, Rômulo e Remo, que começaram por se matar mutuamente." (Tradução de Anna Capovilla)
E cada noite, é o mesmo carrossel. Em grupos, nas sombras, 30, 50 homens chegam até o Porto de Calais e ao Eurochannel e tentam embarcar nos furgões. Os guardas os escorraçam. Os migrantes se retiram. Mas recomeçarão dez, cem vezes. Na noite de terça-feira, 2.500 exilados tentaram entrar na Grã-Bretanha. Cinquenta deles conseguiram. Cerca de 20 ficaram feridos. Um migrante foi morto pela manobra de um peso pesado desesperado. Outro foi eletrocutado. (...)
O lamentável episódio, que ocorre após uma série de outros, confirma uma verdade evidente aos olhos de todo o mundo, salvo aos olhos dos governos da Europa: os migrantes são um espinho doloroso no flanco da Europa, da União Europeia. Infelizmente, o drama dos migrantes manifesta de maneira clara que, apesar da União Europeia, o egoísmo sagrado das nações é muito forte no continente supostamente unido. Egoísmo? Por que a Itália deve lutar sozinha, sem um apoio sério de Bruxelas, para acolher multidões de migrantes que só transitam por seu território para se dispersar em seguida por toda a Europa? Por que deixar a Grécia, país em ruína, se debater sozinha com os milhares de africanos moribundos que aportam em suas plagas? E por que a França deve, sozinha, sem um apoio concreto da União Europeia, administrar a presença de 5 mil migrantes acotovelando-se no Porto de Calais à espera de uma carona, quase impossível, para a Grã-Bretanha?
A União Europeia, assim como a zona do euro, não trouxeram a prosperidade à Europa. Trouxeram a crise, o desemprego, o caos. Mas este não é o único fracasso da União Europeia. Ela é praticamente nula em matéria de fraternidade e de economia. Foi incapaz de dar um início à concretização das grandes esperanças que os criadores do euro, há 60 anos, haviam previsto em seu tratado. Eles juraram fazer da Europa um vasto espaço em que o amor substituiria a guerra, um continente onde reinaria a fraternidade. Hoje em dia a fraternidade é bela. É bem verdade que quando do primeiro balbucio histórico da Europa, a futura Roma foi criada por dois irmãos, Rômulo e Remo, que começaram por se matar mutuamente." (Tradução de Anna Capovilla)